domingo, fevereiro 07, 2010

Quando éramos losers
Houve um tempo em que o cuecão era a lei e um homem tinha que saber tirar chiclete do cabelo

Uma cena da minha pré-adolescência ficou muito bem gravada na minha memória. Foi numa manhã antes da aula, por volta das sete. Eu, então com uns 13 ou 14 anos, entrei em um dos botecos que rodeavam o Colégio Objetivo de Goiânia. Comprei um chiclete dos Cavaleiros do Zodíaco, coloquei uma ficha na jukebox para ouvir Raimundos e fui jogar Street Fighter no fliperama.

Nisso, uma colega de colégio encostou de lado na máquina. Ela quase não falava comigo e sempre estava de nariz empinado. Usava uma blusa do Hard Rock Café, como todas as outras que já tinham ido para a Disney. Com um olhar forçosamente reprovador fez um “tsc, tsc, tsc” e me perguntou “quando você vai crescer?”. Para terminar seu bullying-happening colocou um cigarro Free Light (também conhecido como “ar sabor cigarro”) na boca e deu uma tragada com os olhos fechados. Subitamente começou a tossir como uma velha asmática me olhando com raiva como se aquilo tivesse sido culpa minha.

Houve um tempo em que ser adolescente era isso: era ser zoado. Não era algo que “agredia a auto-estima”. Era apenas apontar a cara do pentelho mais próximo e soltar um sonoro “DAHR”. Estendíamos o indicador e o polegar em L na testa mostrando a língua ou com aquela cara de indiferença juvenil. A própria zoação por si só era uma idiotice sem tamanho. A imbecilidade se retro alimentava de hormônios, frustrações e cenas vergonhosas.

Imagino um moleque repreendido na escola por ter apelidado um “coleguinha” (adoro quando tratam crianças pelo diminutivo, psicologia xuxesca pura). Penso no quanto esses pestes podem ser mais criativos. “Pirulito”, “biloquê”, “caixa d’água”, “Sputnik”, “maçã do amor”. Quero dizer, “cabeção” pode ser um trunfo em termos de agressão, mas não tem a sofisticação de “ele não passa piolho porque a gravidade da cabeça dele não deixa”.

Quando leio certas publicações e textos que falam em “auto-estima” imagino um mundo acolchoado e de cantos redondos. Uma utopia asséptica onde ninguém se machuca ou se sente mal. Para quê?

Eu acredito que amadurecer é saber lidar com críticas. E não me venham falar em crítica construtiva. Isso é coisa de gente de sorriso bobo e voz mole, o tipo de gente que fala com qualquer um como se falasse com uma criança. Se uma pessoa não encara a afronta do outro, como ela se reconhece ou até se impõe?

Houve uma época em que nós tínhamos um mínimo de atrito na adolescência. Esta insistência em um mundo sem estes atritos só cria pessoas ainda mais sujeitas a frustrações e que não sabem lidar com divergências ou só lidam em termos de cortesia. Cortesia pode ser uma das melhores virtudes do homem, mas a corda rói eventualmente. E daí aparecem os pitis. Daí as pessoas se chamam de “intensas”, “sensíveis” ou “condoídos”, quando deveriam ser chamadas de “imaturas”.

As pessoas crescem. Aprendem que o mundo é mau e todo mundo morre no final. É uma lição muito mais tenra do que a maioria das pessoas imagina. O Poetinha já falava que “é melhor viver do que ser feliz”. Quando Vinicius de Moraes estava nos Estados Unidos traduzindo sua obra para o mercado fonográfico, um americano observou: “It’s better live AND be happy”. Não entendeu. Gringo burro!

6 comentários:

Anônimo disse...

Adorei mesmo! Até hj me arrependo por não ter sido uma criança/adolescente cruel. Me sentia menor do q todo mundo e achava q "zoar" os outros era coisa do mal.

Anônimo disse...

Nada a ver!!! Era legal ser cruel sim! Mas passou!!! Agora vc adulto, ja deveria ter se auto-reconhecido e ter aprendido a se defender... É mostra de imaturidade querer vivenciar as mesmas coisas da adolescência pretendendo tirar delas os mesmos benefícios. O legal, da fase adulta, é ver as coisas boas dos outros, elogiar, reconhcer qualidades, é facil! Com a maturidade vc percebe que viver tranquilo é bem melhor do que ficar xingando e esperando o mesmo dos outros. Seu burro! E, me diga, o "poetinha" tinha qtos anos quando disse aquilo? Ho! Bj!

Anônimo disse...

Rensga! Muito bom mesmo!

Anônimo disse...

Rensga! Muito bom mesmo!

Unknown disse...

A rejeição à gentileza parece ser fruto de uma incapacidade de abrir mão da sua auto-rejeição. Quando a pessoa internaliza todas a depreciação que ela sofreu, começa a acreditar nelas, começa a se tornar intolerante aos elogios. Ela toma sua auto-imagem distorcida como a imagem real e se agarra a sua dor como um bichinho de pelúcia, que ninguém pode tirar dele. É sua defesa, "I am in love with my sadness" e qualquer um que não esteja é um burro, um covarde, um bobo, um ser manipulado.

Acho que o que realmente te incomoda é que você não quer crescer. Acha que maturidade é endurecer o coração, porque o mundo é mau e não te deixa chupar seu pirulito em paz (então odeie tudo e seja superior a todos eles), mas a cabeça continua sendo de criança.

Wearin' them pants disse...

Esse eu gostei! hahaha!