terça-feira, outubro 26, 2004

Murphy e as viagens de ônibus

Uma viagem de ônibus a princípio é algo extremamente simples: colocar a(s) mala(s) no bagageiro, basta entregar o bilhete, entra no ônibus, sentar na poltrona e esperar chegar a seu destino (uma vez lá basta levantar da poltrona, sair do ônibus e pegar a bagagem). Uma tarefa que apesar de composta por várias etapas é bem simples (até uma criança devidamente acompanhada portando uma autorização dos pais e certidão de nascimento pode fazer isso). No entanto, como sabem os murphystas, a Lei de Murphy permeia todos os processos possíveis. Viajar de ônibus (assim como qualquer tarefa) não é algo tão simples.

A Lei de Murphy se manifesta nas viagens de ônibus seguindo estes principais postulados:

Postulados da Bagagem
A bagagem talvez é um ponto de grande influência de Murphy nas viagens de ônibus. Merecendo assim uma série de postulados.
"Sua bagagem sempre será a última a ser tirada do bagageiro."
"A probabilidade de se perder uma mala é diretamente proporcional ao valor do conteúdo dentro dela."
"Quanto mais frágil o conteúdo da sua mala, maior a probabilidade de uma mala extremamente pesada ser colocada em cima."
"Quanto mais visível a sua mala, maior será a probabilidade do carregador não pega-la logo de uma vez."
"Bagagens de mão colocadas na prateleira acima dos acentos são sumariamente esquecidas. Aquelas levadas na mão passam a viagem inteira incomodando de alguma forma."

Postulados dos acentos
O acento também é um aspecto onde a Lei de Murphy pode se manifestar de várias formas.
"A probabilidade de você se sentar em um acento com o mesmo número que a plataforma onde está o ônibus é de 1/n, tal que "n" é o número de acentos no ônibus. Uma vez sentado na poltrona com o mesmo número que a plataforma, a chance de alguém sentar no seu lugar por ter se confundido é de 100%."
"As janelas sempre estão ocupadas. Uma vez sentado no corredor a freqüência com que o sujeito da janela vai ao banheiro é a máxima possível."
"Quanto mais demorada a viagem, maior é a probabilidade de seu acento ser perto do banheiro."
"Seu acento nunca poderá ser posicionado de maneira agradável."

Postulados da Pessoa ao lado
"Uma vez que você tenha conseguido ficar com a janela, a pessoa ao seu lado sempre terá chegado primeiro e sempre estará em seu acento. Uma vez nesta situação ele sempre insistirá para ficar no acento da janela."
"O sujeito do seu lado sempre terá o oposto do seu gênio: quando você estiver bem humorado será um rabugento, quando você estiver mais reservado será um tagarela..."
"A quantidade de palavras emitidas pelo sujeito ao seu lado é inversamente proporcional ao seu interesse."
"A pessoa do seu lado NUNCA é uma daquelas modelos ninfomaníacas que têm taras por fazer sexo em veículos em movimentos que as cartas de revistas masculinas falam tanto."

Postulados da Pessoa atrás
"Quanto mais sono você tiver, mais o sujeito a trás de você implicará com seu acento reclinado."
"Quanto mais sono você tiver, mais estridente e irritante será a voz da pessoa atrás de você." (Nota pessoal: certa vez viajei 3 horas com uma menininha atrás de mim conversando com o próprio reflexo.)

Postulado do Banheiro
"A probabilidade de que você sinta necessidade de usar o banheiro é infinitamente maior na parte mais esburacada e/ou sinuosa da estrada."

Postulado do ar condicionado
"A eficácia do ar condicionado é proporcional à intensidade com que o sol bate no seu acento."

Postulados da "Gostosa"
A "gostosa" é uma mulher beleza estonteante e extremamente atraente. Em todo ônibus tem ao menos uma (ou alguma perto disso).
"A 'gostosa' nunca sentará ao seu lado. Ela sempre se sentará dentro do seu campo de visão, mas nunca ao seu lado."
"No caso excepcional da 'gostosa' sentar ao seu lado, haverão três possibilidades: ela dormirá a viagem inteira, ela não lhe dará a menor pelota ou ela tem namorado. Não necessariamente nesta mesma ordem, mas provavelmente de maneira simultânea." (Nota: Não vá acordar a moça para perturba-la com um papo mole e ordinário. )

Postulado do filme exibido na viagem
"Os filmes exibidos em viagens de ônibus são divididos em dois tipos: os que você já cansou de ver e os ruins."

Postulado do apoio para o braço
"Os apoios para o braço sempre são insuficientes para 2 (duas) pessoas. A chance do seu parceiro se apoderar dele é de 98% (ainda existe a chance de se viajar ao lado de um deficiente)."

Postulados do horário
"O horário sempre atrasa."
"Sempre que possível você irá viajar em um horário besta. Um horário claro para dormir e escuro para ler."

terça-feira, outubro 19, 2004

What if I want to spit the red pill?

Soundtrack: Smashing Pumpkins – Muzzle
Soundgarden – Like Suicide
Rolling Stones – Gimme Shelter
Pearl Jam - Satan's Bed
Queens of the Stone Age – Go with the flow


Por volta dessa mesma época há 2 anos eu estava criando este blog. A primeira versão do “Putz... Morri” (nome inspirado em uma piada auto-irônica) era feita em Dreamweaver, com uma diagramação tosca e com um layout que lembrava bastante as primeiras página pessoais do Geocities. O conteúdo: reflexões de um cara 20 anos que saíra do lugar onde foi criado (e de onde foi se sentir parte tarde demais para ser nostálgico) vivendo em uma república com amigos de infância (pré-adolescência na verdade...). Era um misto de diário com algumas crônicas que variavam entre uma alta indulgência patética (frutos de um temporário período de depressão) e um impulso pela sátira bruta. Uma série de problemas pessoais, junto com uma frustração vocacional e uma gorda porção de rock'n'roll serviram de inspiração para uma série de textos marcados por uma certa ingênuidade com uma dose mínima de introspecção. Naquela mesma época eu mantinha um caderno com o título de "This funny and wicked season I'm passing thru hell" onde eu escrevia alguns poemas. Por mera intuição porralouquistica eu resolvi queimar o caderno e apagar a primeira versão do blog... Daí a imprecisão da data de fundação do blog (e a subseqüente inexistência daqueles poemas).

A segunda fase do blog ainda tinha um tanto da primeira. A medida que o tempo passou eu fui afastando minha vida pessoal do conteúdo do blog e acrescendo de mais crônicas e mais ensaios. A proposta se tornou mais humorística e os textos um pouco melhor elaborados. Acabara de sair da física e mudar para a comunicação. Foi nesta época que eu fiz a série "Admirável mundo Underground" onde eu satirizei alguns tipos da cena alternativa. Naquela época meu tempo era dividido basicamente entre o blog e a banda que eu tinha na época.

Depois de um longo tempo sem escrever, resolvi elaborar um template mais cool e mudar o endereço para o blogspot. Isso aconteceu na mesma época em que eu e mais 3 amigas criamos o "Peçonha", um blog de "caráter crítico sarcástico" onde eu aprendi uma coisa muito importante: NÃO! Eu não sei trabalhar em grupo! Foi aí que os ensaios começaram a se tornar mais freqüentes, geralmente tratando sobre rock'n'roll, cinema e comunicação. Essa mudança se deu bastante por conta do meu contato na época com Edgar Morin, Umberto Eco e Ortega Y Gasset, e também pelo meu gosto pelo assunto "comunicação" em geral. No blog, eu produzia algo enquanto na faculdade eu era adestrado a apenas reproduzir os textos dos autores (eu acho que a universidade brasileira além de gagá está formando "eruditos apertadores de parafuso"). Por mais pretencioso e "acadêmico" que eu pareça, dúvido que exista alguma conclusão sensata nos meus textos. E se alguém me leva realmente a sério, pelo amor de Deus...-

Depois de mudar para o blogspot o blog passou a ter muitos lapsos de criação. Os motivos nem são tão plausíveis, mas o fato é que de alguma forma eu não consigo conciliar a faculdade (acrescida de alguns trabalhos como "crítico") com a produção para o blog. É realmente engraçado, mas eu passo um semestre ruminado toda a #%@& que me botam para copiar na faculdade para depois produzir alguma coisa nos momentos de folga. PERFEITO! Peguei as últimas férias para produzir uma série de 20 textos para manter o blog atualizado pelo menos de 2 em 2 semanas. Mas Murphy é onipotente, onipresente e onisciente e derramou toda a sua ira sobre o computador da minha irmã em Goiânia.

O futuro do "Putz... Morri" é tão incerto quanto o meu. Depois da temporada saindo do inferno descobri que o que me esperava depois da tempestade não era a bonanza, mas uma chuva chata que empata os planos de um final de semana. Durante o meu 3° ano e o período no cursinho (e o curto período em que eu "cursei" Redes de Computação no Cefet) tudo que eu fiz foi tentar sair de Goiânia de qualquer forma. Não que eu não goste de Goiânia (au contraire, mes amis), mas Goiânia é para mim a capital da comodidade. É o lugar onde eu sou amigo do rei e toda aquela coisa.

Por menos cômoda que seja minha vida em Brasília, toda vez que eu volto de um (ótimo) final de semana em Goiânia me vem um sentimento meio "vini, vidi, vici". Cheguei em Brasília e em poucos meses me adaptei ao lugar, fiz algunso dos meus melhores amigos e conheci pessoas interessantíssimas. Por mais tempo que eu ainda viva em Brasília, ela sempre vai me parecer uma mata virgem de concreto. Sempre há algo de novo e de estranho para se conhecer em Brasília. As pessoas daqui reclamam porque são muito... muito "sem problemas" (como diria um professor meu sobre mim)...

Fato: minha vida em Goiânia é muito mais "de boa" do que aqui. Lá eu não preciso de entrar no limite, nem ficar paranóico com conta, nem ficar me regrando, nem me conter na hora de comprar um livro. A cada dia que passa, a necessidade de um emprego remunerado se torna mais presente (Obrigado, pai! Continue perdulário... pretendo extirpar seus bens ainda!). Mas em Brasília eu fiz uma vida própria minha... minha vida aqui é muito mais minha. Minha casa, "minha" cama, meus amigos...

Eu e meus amigos daqui estivemos em Goiânia no último feriado prolongado. Saímos, levei-os à Praça do Sol onde eles ficaram impressionados com duas coisas: as garotas e o preço das coisas. Justamente a principal queixa de todo mundo quanto a Brasília. A minha tange muito mais a dinheiro do que a mulher... mas tange pacas.

"Você deve ficar pensando em voltar para cá todo final de semana que você vem, né?", perguntou meu amigo Daniel (o primeiro que eu fiz em Brasília). Pior que é verdade. Mas como Neo no primeiro Matrix, eu acho que não posso cuspir a pílula. Já entrei, não tem volta. Por melhor que seja voltar, eu nunca iria me perdoar. Nem que me descem a chave da cidade. Por mais tosca que seja minha situação em Brasília, eu digo ao povo que fico. É um osso duro de roer do qual eu não abro mão...

sexta-feira, outubro 08, 2004

“Eu detesto a banda do meu amigo!”

Quem freqüenta o meio underground e tem um maior contato com bandas costuma ter amizades com músicos. É algo normal, algo que vai do conhecido até o “brother de fé” como com qualquer outro amigo (a não ser que você não seja uma groupie). No entanto, quando se é amigo de um músico muitas vezes você é visto como uma espécie de “aliado da banda”, uma espécie de fã automático.

A relação "você-amigo-banda do amigo" é bastante parecida com a relação você-amigo-namorada do amigo, mas com uma série de agravantes. O primeiro é que a namorada do cara pode ser osso duro de roer, mas o seu amigo não tem nada haver com isso. Em contrapartida, se a banda do seu amigo é uma mala sonora ele certamente tem uma porcentagem de culpa nisso. O segundo é que seu amigo geralmente não te chama para você assisti-lo namorando (a não ser em certos casos especiais). Já com a banda, ele faz questão que você vá e fique na frente do palco (isso quando ele não dedica uma música a você ou tira com a sua cara em pleno show). O terceiro é que você deve receber a banda do seu amigo com um sorriso na cara de orelha a orelha (no caso da namorada do seu amigo isso não é muito aconselhável).

Você não ir com a cara da namorada do seu amigo é uma coisa. É só você evitar a presença dela e se utilizar de uma série de artimanhas da diplomacia e da cortesia para deixar isso de alguma forma oculto. Não gostar da banda do seu amigo já é um calvário. Você se sentir obrigado a ir aos shows, a comprar o CD, a divulgar e na pior das hipóteses você ser convidado para escrever o release da capa. Isso tudo é um suplício quando se acha que a banda do seu amigo é o maior xabú. No entanto, o pior é o castigo constante da pergunta constrangedora: “O que você acha da minha banda?”

O que responder?

“Olha, eu não gosto da sua banda... mas eu gosto tanto de você como amigo!”. Isso costuma ser uma poderosa saída das garotas sobre seus amigos mais esperançosos, mas se lembre que por trás de cada um desses caras existe uma aura de frustração de se dar dó. É uma resposta tão boa quanto “Isso acontece com todo mundo!” e “Pelo menos você está com saúde!”

“Pô, é um som diferente pá e tal... meio setentista, meio anos 80, com um pouco de punk e de folk!”. Esse tipo de resposta vai depender basicamente de duas coisas de você: conhecimento musical e picaretagem. Utilize o máximo de nomes de bandas obscuras, cite estilos a granel e invente o máximo possível. Mas em hipótese alguma utilize as palavras “BOA” ou “RUIM”. Dependendo do grau de convencimento do seu amigo você pode comparecer a qualquer tribunal (ou começar a escrever críticas musicais).

“MASSA!”. Uma opinião concisa e direta. Diga isso uma única vez e coloque um cigarro e uma cerveja na boca para disfarçar essa sua cara-de-pau muito bem envernizada. Enquanto bebe a sua cerveja e fuma o seu cigarro trate de ouvir do seu amigo todos os detalhes da experiência que ele teve e reze (mas reze muito) para ele não te perguntar nada mais comprometedor do que “A guitarra estava afinada?”. Dependendo do tanto de óleo de peroba que reveste o seu rosto faça o seguinte: qualquer defeito que seja apontado pelo seu amigo confirme dizendo “Mas isso foi por conta do cara da mesa de som, né?”.

“Sua banda é uma merda, desgraça! Quando você vai perceber a porcaria que a sua banda toca. No dicionário Aurélio em CD para cegos, eles poderiam utilizar uma gravação de você tocando para ilustrar o verbete “PÉ-NO-SACO!". Bem, esta é uma saída nada diplomática, educada ou polida. No entanto, quando o seu amigo derramou vinho no seu quarto, ou quando ele fez aquele moicano horrível ou até quando ele furou com você naquele trabalho de escola (ou de faculdade) você respondeu algo bem parecido. É claro que isso magoará seu amigo, mas certamente ele terá você como alguém sincero (apesar de ser um belo de um esculachado). A eficácia dessa resposta é bem questionável, seu amigo pode muito bem começar a fazer "doce" te chamando para um show da tal banda e falando logo depois "Ah! Mas você não gosta!".

Essas são saídas que variam dependendo do gosto do freguês. Seu amigo provavelmente vai aceitar que você não goste do som dele, mas ele nunca irá entender. Você continuará indo aos shows em nome da sua amizade e toda a vez que seu amigo vir te perguntar o que você achou certamente você irá ter um certo molejo na hora de tratar do assunto. No caso de você ter tido alguma vez uma banda com esse amigo NUNCA (mas bem NUNCA mesmo) compare a antiga banda de você em detrimento da atual dele. Isso pode render um enorme bate-boca onde ele irá enumerar quantos ensaios você faltou da outra banda e toda a responsabilidade que você tem sobre o fim daquele que pode um dia ser o novo Led Zeppelin...


PS.: Este é um texto em homenagem ao The Zeroes, uma das minhas bandas-de-amigos favoritas e que fará seu último show nesta sexta dia 08/10. Infelizmente não poderei estar em Goiânia, o que eu sinceramente lamento muito!