segunda-feira, dezembro 05, 2005

Ensaio com pinta prepotente e título enorme para um homem comum (ou mais uma abobrinha com uma referência musical infame no título e dois títulos para dar um clima enigmático)

Um cara passa gritando pela T-9 comemorando o jogo do Goiás. O Corinthians foi campeão mesmo assim! Scheiss! E o saco é que eu invejo o desgraçado. Eu invejo um filho da mãe com resto de galinhada com piqui nos dentes.

Quando foi que começou? Não sei! Acho que foi aos 16? Putz, já tenho mais hora de showzinho que urubu de vôo. Putz, eu podia ter um diploma em engenharia! Eu podia ter barzinho aos domingos e um Gol para lavar no domingo de manhã! Encerar o carro e depois, cheirando como uma concessionária de carros semi-novos (um eufemismo nouveau riche para "usado") entrar com a Rider molhada pela porta da frente e acabar dando a volta na casa para não sujar o tapete comprado no cartão nas Casas Pernambucanas ("Parcelado, mas foi no cartão... não foi de carnezinho!").

Sentar na mesa tubular da cozinha e discutir a escalação do jogo. Falar que "no tempo do Ronca o time era melhor" e que "não se fazem mais carros como antigamente" e que "o primo do meu colega da firma tá investindo na criação de ornintorrincos". E o que tiver errado é culpa do governo.

"Governo? Eu tinha aprendido que a culpa é do sistema! Toda aula um professor de camiseta do Che Guevara falava que a culpa era do sistema!". Ninguém discute comigo. Eu sou formado em engenharia. Eles acham que eu sei de alguma coisa. Eu também acho!

A galinhada demora mais meia hora! Eu sento e tomo mais uma cerveja. Gelada! Abro uma lata de castanha de cajú! Podemos opinar sobre tudo sem receio que haja algum catedrático do assunto por perto. Não há críticos de arte sacra, aficcionados por orquídeas ou catedráticos em ginecologia angelical por perto! Podemos discutir sobre tudo! E nem há hostess, DJ`s, produtores, artistas plásticos ou webdesigners por perto. Nenhum desse povo que não contribui com o PIB do país. É um engenheiro (eu), um médico, um advogado e um corretor de imóveis tomando cerveja e falando à toa.

A galinhada saí! Todo mundo come. Os homens continuam papeado em voz alta enquanto as mulheres contam os pratos que comem (e o que as outras comem também). Depois tem pavê ("É pá vê ou pá cumê?") e cafezinho.

Assisto o jogo em casa porque da última vez que eu fui no "Serra" roubaram o som de um colega da firma. O Goiás ganha. Massa! Encho o lata e passo buzinando e correndo pela T9.

Mas eu estou aqui! O Corinthians ganhou o campeonato! Eu não queria ver o Corinthians ganhando! O meu time já tava fora do páreo para o título e a vaga da Sulamericana já tava garantida! Campeonato de ponto corrido é como cerveja sem álcool. Até no futebol os politicamente corretos se infiltraram. Malditos hippies.

Queria ser capaz de fazer algo realmente muito estúpido! E ser reconhecido pela minha estupidez! E ganhar dinheiro com isso! É isso o que eu queria agora! Sabe qual o nome disso? Isso se chama "realização pessoal". É o que um hippie chato consegue quando ganha milhões de dólares vendendo artesanato em uma praça! É o que um catedrático em comunicação ganha torturando seus alunos! É o que um ex-participante de reality show consegue quando ganha um talk show em um canal decadente.

Eu me contento com pouco! Basta eu ser... sei lá! Tendo cerveja de graça tá massa!

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